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sexta-feira, 10 de julho de 2015

Preconceito e injúria racial no Brasil contemporâneo



*Rosana Schwartz

O Brasil contemporâneo presencia uma crise política, econômica e social. Desde 2013 a rejeição aos modelos de sociedade, guardiãs de estruturas políticas ultrapassadas, que não conseguem proporcionar vida cotidiana digna para todos os cidadãos, balizam pautas diferenciadas e afloram comportamentos moderados e radicais. Durante a década de 70, nas entranhas do crescimento do Estado Autoritário brasileiro, a necessidade de mudança para um Estado Democrático cristalizou a necessidade de organização e ação dos sujeitos/participantes em movimentos organizados. A centralidade estava na efetivação dos direitos sociais e na emergência de novos sujeitos – minorias – nas instâncias de poder. Passados os anos 80, 90 até a atualidade, diante do afastamento dessa centralidade pelas facções de esquerdas e centro-esquerda e decepções com relação às ações realizadas pela política partidária, ações coletivas alimentaram as esperanças de múltiplos coletivos nas redes sociais em direção à construção de uma nova sociedade. Entretanto, nesse processo, radicalismos despontaram e abriram as portas para posições preconceituosas, tanto de gênero como de raça e classes sociais. O preconceito racial no Brasil é encoberto pela ideia de Democracia Racial, pelo processo de mestiçagem e plasticidade etnico/racial advinda de Portugal ( povo híbrido desde a conquista moura de seu território e domínio das regiões na África e Ásia). O conceito de raça aparece metamorfoseando diversas etnias em escravos subalternos e inferiores intelectualmente, ou seja, o negro é uma invenção marcada pelas relações de poder. O preconceito gestado no período colonial escravagista permanece na contemporaneidade através dessa simbologia adensado pelas teorias racistas do século XIX, que afirmavam existir raças, gêneros e classes sociais superiores e inferiores.  Interpretes sobre o Brasil revelaram a permanência das premissas dessas teorias em camadas sociais altas e médias, remanescentes da classe senhorial. O racismo é  um mecanismo de privilégio de classe. Em uma sociedade que se organizou sob a ordem patriarcal oligárquica, a posição social dos sujeitos no meio manifesta múltiplos preconceitos de raça,gênero e classes. A Carta Cidadã, nossa Constituição em seu art. 5º, inciso XLII versa sobre a prática do racismo como “crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão”. Em seu art. 3º, defende uma sociedade sem preconceito de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, como um dos objetivos fundamentais da República. Não obstante, presenciamos cotidianamente manifestações de cunho racista ou injúrias raciais nas ruas, nas escolas, no trabalho e nas redes sociais. As marcas da sociedade patriarcal escravagista e o processo de abolição, que não incluiu o negro e seus descendentes na sociedade, carecem de debates e reflexões aprofundadas. O Estado brasileiro comprometeu-se com os movimentos sociais a corrigir as assimetrias de raça e gênero, adotou proposições das Conferências da Organização das Nações Unidas (ONU), como a Declaração de Durban (2001), que objetiva eliminar o racismo e discriminação de qualquer ordem. Combater a prática de racismo é responsabilidade de todos os cidadãos. Retrocessos com relação a essa questão no Brasil desvelam as permanências de patologias sociais criadas em um passado não tão distante. Repudiemos alarmantes injúrias e preconceitos raciais praticados tanto nas redes sociais como em qualquer lugar, para caminhar na estrada da tolerância, educação para a paz e respeito aos Direitos Humanos.

*Rosana Schwartz é professora de sociologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Doutora em História, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2007). Mestre em Educação, Artes e História da Cultura, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie - UPM (2001). Bacharel em História, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC/SP (1989).




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