*Rosana Schwartz
O Brasil contemporâneo presencia uma
crise política, econômica e social. Desde 2013 a rejeição aos
modelos de sociedade, guardiãs de estruturas políticas ultrapassadas, que não
conseguem proporcionar vida cotidiana digna para todos os cidadãos, balizam pautas
diferenciadas e afloram comportamentos moderados e
radicais. Durante a década de 70, nas entranhas do crescimento do Estado
Autoritário brasileiro, a necessidade de mudança para um Estado Democrático
cristalizou a necessidade de organização e ação dos sujeitos/participantes em
movimentos organizados. A centralidade estava na efetivação dos direitos
sociais e na emergência de novos sujeitos – minorias – nas instâncias de poder.
Passados os anos 80, 90 até a atualidade, diante do afastamento dessa
centralidade pelas facções de esquerdas e centro-esquerda e decepções com
relação às ações realizadas pela política partidária, ações coletivas
alimentaram as esperanças de múltiplos coletivos nas redes sociais em direção à
construção de uma nova sociedade. Entretanto, nesse processo, radicalismos
despontaram e abriram as portas para posições preconceituosas, tanto de gênero
como de raça e classes sociais. O preconceito racial no Brasil é encoberto
pela ideia de Democracia Racial, pelo processo de mestiçagem e plasticidade
etnico/racial advinda de Portugal ( povo híbrido desde a conquista
moura de seu território e domínio das regiões na África e Ásia). O
conceito de raça aparece metamorfoseando diversas etnias em escravos
subalternos e inferiores intelectualmente, ou seja, o negro é uma invenção
marcada pelas relações de poder. O preconceito gestado no período
colonial escravagista permanece na contemporaneidade através dessa simbologia adensado
pelas teorias racistas do século XIX, que afirmavam existir raças, gêneros
e classes sociais superiores e inferiores. Interpretes
sobre o Brasil revelaram a permanência das premissas dessas teorias
em camadas sociais altas e médias, remanescentes da classe
senhorial. O racismo é um mecanismo de privilégio de classe. Em
uma sociedade que se organizou sob a ordem patriarcal oligárquica, a
posição social dos sujeitos no meio manifesta múltiplos preconceitos
de raça,gênero e classes. A Carta Cidadã, nossa Constituição em seu art.
5º, inciso XLII versa sobre a prática do racismo como “crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena de reclusão”. Em seu art. 3º, defende uma
sociedade sem preconceito de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas
de discriminação, como um dos objetivos fundamentais da República. Não
obstante, presenciamos cotidianamente manifestações de cunho racista ou
injúrias raciais nas ruas, nas escolas, no trabalho e nas redes sociais. As
marcas da sociedade patriarcal escravagista e o processo de abolição, que não
incluiu o negro e seus descendentes na sociedade, carecem de debates e
reflexões aprofundadas. O Estado brasileiro comprometeu-se com os movimentos
sociais a corrigir as assimetrias de raça e gênero, adotou proposições das
Conferências da Organização das Nações Unidas (ONU), como a Declaração de
Durban (2001), que objetiva eliminar o racismo e discriminação de qualquer
ordem. Combater a prática de racismo é responsabilidade de todos os cidadãos. Retrocessos
com relação a essa questão no Brasil desvelam as permanências de patologias
sociais criadas em um passado não tão distante. Repudiemos alarmantes injúrias
e preconceitos raciais praticados tanto nas redes sociais como em qualquer
lugar, para caminhar na estrada da tolerância, educação para a paz e respeito aos
Direitos Humanos.
*Rosana Schwartz é professora de
sociologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Doutora em História, pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2007). Mestre em Educação,
Artes e História da Cultura, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie - UPM
(2001). Bacharel em História, pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo- PUC/SP (1989).
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